terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Entrevista completa com Earl Slick, guitarrista de David Bowie


Como grande fã de David Bowie, a obrigação máxima do ano para o Filho do Blues é a cobertura completa de todo o lançamento do tão aguardado novo disco, The Next Day, o primeiro em uma década. Toda novidade em relação ao álbum com certeza estará aqui no blog. Após as considerações de Tony Visconti sobre The Next Day, foi a vez do guitarrista e também colaborador de longa data de Bowie, Earl Slick, dar suas palavras sobre o processo de gravação e de como soam algumas das músicas.

Primeiro algumas palavras sobre Earl Slick e sua relação na carreira de Bowie. Dentre muitos outros guitarristas que já trabalharam com David Bowie, Earl Slick foi chamado pela primeira vez no disco Diamond Dogs, de 1974. Depois, Slick participou ainda dos dois clássicos álbuns, Young Americans e Station to Station. Passado vários anos, Earl Slick voltou a tocar com Bowie nos álbuns Heathen e Reality e em suas respectivas turnês. Por fim, Earl Slick foi convidado por Bowie para trabalhar no seu disco de retorno e foi proibido completamente de dar uma palavra sobre o assunto. Até agora. Na entrevista para o site Rolling Stones, Earl Slick falou sobre as novas músicas e da possibilidade de turnê, além das memórias das insanas sessões de gravação de Station to Station. Tradução na íntegra:

Há poucos anos, você começou a achar que Bowie nunca gravaria novamente? 


Minha mente iria para frente e para trás, em ambas direções. Uma coisa que eu sei é que uma vez que você é um artista, você é um artista até o dia em que você morre. A urgência sempre estará lá. Eu nunca acreditei na idéia de que ele estava acabado. Nunca. 


Como você ouviu pela primeira vez sobre o projeto?

Eu ouvi sobre isso diretamente de David no último mês de Maio. Nós estávamos falando ao telefone, e ele disse: ‘Como está sua agenda?’. Eu disse: ‘estou disponível. O que você tem em mente?’ Uma conversa direcionou a outra e nós programamos para ir ao estúdio em Julho. 

Como a primeira sessão começou? 


Ele já estava trabalhando nisso, desconhecidamente para mim. Ele já tinha algumas faixas. No meu primeiro dia foi eu, David, Tony Visconti e o baterista Sterling Campbell. Nós tocamos algumas das novas. Quando terminamos elas, David me contou algumas coisas sobre o resto do álbum. Ele disse: ‘Oh, o que você acha disso ou daquilo?’ Nós então escolhemos algumas músicas para eu tocar. A coisa toda foi muito casual e foi tudo um esforço do grupo. Nós nos sentávamos e ele tocava uma música e eu diria se eu tinha alguma parte na minha mente. Foi muito dar-e-levar, uma forma de trabalhar muito casual. Algumas vezes, ele toca para mim algum pedaço na guitarra e diz: ‘Essa é a idéia. Agora a leve para onde você quiser ir’. 


Por quantos dias você esteve lá? 

Eu só estive lá por uma semana. Eu fiz todo meu trabalho em uma semana. 

Quando foi?

Última semana de Julho, ou alguma coisa assim. Tudo o que sei é que estava quente pra caramba do lado de fora. 

Tony diz que o single “Where Are We Now?” soa radicalmente diferente do restante do álbum. 

Eu não sei qual é o resultado final do álbum, mas eu sei que muitas das coisas que eu toquei eram muito diferentes do single. 

Elas são similares às músicas em Heathen e Reality? Como você descreveria o som das músicas? 

Oh deus, eu não sei se esse cara já fez um álbum na sua vida que soasse igual ao último que ele fez. Pense sobre isso. Você faz Young Americans e menos de um ano depois, você faz Station to Station. Você está falando de duas coisas completamente diferentes. Esses álbuns, eles nem mesmo... É uma coisa bem típica de Bowie. É, sem enganos, David Bowie, como sempre. Obviamente, há de tudo. Você pode pensar: ‘oh, isso soa como Station to Station e essa soa um pouco como Low.’ Mas não há um som único, além de dizer que é mais um álbum de David Bowie que soa diferente que o último.

Você sabe dizer em quantas músicas ele o usou?

Eu não ouvi o álbum ainda, mas irei chutar que eu estou em cinco ou sete das músicas. Eu vi os títulos nos últimos dias, mas eles não significam nada para mim. Todas elas tinham títulos provisórios quando eu estava lá. 

Você pode descrever o som das músicas um pouco mais?

Duas das músicas soam um pouco como Stones do mesmo jeito que a faixa título de Diamond Dogs tinha muito do som dos Stones, especialmente quando se toca ao vivo. Não é nenhum segredo que eu sou um grande fã de Keith Richards, então eu tenho muito dele na minha forma de tocar. Eu fiz alguns ritmos de algumas faixas que eram muito remanescentes a esse som.


Quanto ao resto do álbum, é o toque de Bowie sobre tudo. Há algumas bem rock lá. Eu provavelmente ouvi algumas que não fizeram o álbum, mas tem uma com um meio tempo, quase como um clima R&B. Eu não consigo nem descrevê-la, mas era muito legal. Era quase o mesmo tempo que “Wild Is The Wind”. Eu toquei guitarra nela. 


Você trabalhou com Bowie por muitos anos. O processo desse foi alguma coisa diferente dos outros álbuns?

Não mudou nada em 40 anos. Eu trabalhei com muitas pessoas, e ele é sempre o mais fácil. Ele não vem colocando limites, tipo: ‘isso é o que é e você deve tocar essas notas exatas dessa forma’. Alguns artistas fazem isso e é o porque eu raramente faço sessões. Eu sou muito brigão. 


Há uma certa mágica quando eu sento na sala com David. É o porque você verá diferentes guitarristas tocando com ele. Ele não espera que eu faça o que Adrian Belew faz. Ele não espera Adrian fazer o que faço, ou Gerry Leonard, ou vice-versa. Quando estou lá, ele precisa que eu faça o que faço de melhor. ‘esses são os guias básicos. Quais são as notas? Oh, eu acho que o tom é G. Certo, ótimo’. Então nós sentamos, nós tocamos violão e depois apenas conversamos por alguns minutos. Depois, eu coloco minha guitarra e toco até nós dois estivermos felizes com isso. 



A grande pergunta: Alguma chance de vocês tocarem ao vivo?

Eu sabia que essa era a próxima pergunta. Esse é outro mistério. Quer dizer, a banda adoraria fazer isso. É óbvio que gostaríamos de sair e fazer alguns shows. Com David, e esse é sempre o caso, ele faz o que ele vai fazer e quando ele quer fazer. Muitas das vezes apenas vem do nada. Eu digo, eu não estava terrivelmente surpreso quando conversei com ele para fazer outro álbum. Eu não ficaria surpreso se ele marcasse alguns shows, assim como não seria surpresa se eu não recebesse a ligação. Eu posso lhe dizer que agora não há planos para turnê, que eu tenha ouvido. 

Não muitas pessoas apreciaram isso na época, mas aquela última turnê foi muito especial.

De todas as turnês que fiz na vida – e nisso inclui David e minhas próprias turnês – aquela, sem dúvida, foi a mais divertida que já tive. Foi a melhor reunião de pessoas que nós já tivemos. 

Se ele ligasse para você amanhã e dissesse: ‘Ei, eu quero ir em uma longa turnê de dezoito meses’, o que você diz? 

O que você acha? 

Eu presumo que você iria. 

(Risos) Claro. 

Só uma pergunta automática. Eu li tanto sobre como Station to Station foi feito no decorrer dos anos – todas as drogas e sessões pela noite toda e a loucura geral – há alguma verdade nisso? 

Não, não é um mito de forma alguma. 

Qual sua memória do momento mais estranho?

Aquela coisa toda foi muito estranha! Eu digo, naquela época parecia muito normal para mim. Mas recordando.... Eu lembro uma noite onde nós não tínhamos nem mesmo o estúdio agendado. Quantos anos eu tinha? Cristo, eu tinha 24 anos. Era em LA, e nós estávamos saindo e curtindo toda noite, tendo explosões. Eu estava no bar Rainbow and Grill. Como costumávamos dizer, eu estava ‘no clima’. De repente, um dos roadies entraram. Eles procuram por todo o local e me acham numa mesa escura. Ele diz: ‘Hora de ir trabalhar’. Eu digo: ‘é uma da manhã e eu estou bêbado’. Ele diz, ‘Tá certo, David está no estúdio, há um carro lá fora.’ Então paguei minha conta, pulei no carro e trabalhei a noite toda. Quer dizer, aquilo não era uma coisa fora do normal de acontecer.

David diz que não consegue lembrar a maioria disso.

Acredite em mim, há vários espaços em branco em mim também. Eu estava vivendo no Sunset Marquis e seria dia quando eu voltei. E eu estaria sentado no meu balcão bebendo cerveja às dez da manhã, apenas voltando do trabalho. 

Roy Bittan da E Street Band estava nos teclados, certo?

Sim 

Ele sempre pareceu tão reto e profissional para mim. Eu não consigo imaginar no meio de toda essa loucura.

Você sabe porque? Ele é um garoto de Nova Iorque, esse é o porquê. Ele está acostumado a estar em meio àquilo. A primeira vez que conheci Roy foi em Nova Iorque quando eu estava trabalhando numa banda chamada Tracks ou algo assim. Eu conheci Roy e nos tornamos rapidamente amigos. Nós estávamos fazendo Station e surgiu que precisávamos de um pianista. David perguntou a todos na banda e eu disse, ‘sabe o que? Bruce Springsteen e os caras estão ficando no meu hotel. Meu amigo Roy está na banda. Por que não chama ele?’ Isso foi o que aconteceu com Roy. 

Eu sempre imaginei como aquilo funcionou para ele. Aquilo foi diretamente no meio da turnê de Born to Run. Como ele teve tempo?

Eu não posso jurar quanto a isso porque eu tenho muitos brancos, mas eu acho que foi quando Springsteen tinha duas noites no Roxy. Foi na mesma época que ele estava na capa da Time ou Newsweek. Ele estava explodindo e ele estava em LA por pouco tempo. Nós estávamos todos no mesmo hotel. Novamente, tem vários espaços em branco e eu não sei se Roy esteve no estúdio por um dia ou dois. 

É bem incrível que o álbum acabou saindo tão perfeito. 

Eu tenho que lhe dizer, de todos os álbuns em que eu toquei, e eu toquei em alguns álbuns, esse ainda é um dos meus favoritos. Tão louco como foi, e eu não posso lembrar especialmente de muita coisa, as memórias que eu tenho são boas (risos) Me faz ter boas lembranças do álbum, então deve ter sido divertido.


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