segunda-feira, 15 de abril de 2013

The Flaming Lips - The Terror


A música é, acima de tudo, uma comunicação de sentimentos, de sensações. E nesse profundo mar de sentimentos que é a alma humana, existem as emoções que todos gostam de sentir. Quem não gosta de fechar os olhos e se imaginar nos braços da pessoa amada quando se escuta uma bela canção de amor? Ou então sentiu o coração sangrar quando se depara com as impressões de um fim de relacionamento? Ou as quatro paredes se fecharem sobre si numa melancólica canção solitária? Enfim, são infinitos os caminhos e as expressões que os seres humanos podem transmitir. Mas, assim como o citado oceano profundo, também há em nós aquelas profundezas escuras, as quais não ousamos nem ao menos encarar. É como aqueles peixes horrendos que vivem submersos e supostamente esquecidos nas águas escuras. Citando Shakespeare, “Há mais coisas entre o céu e a terra do que supõe nossa vã filosofia”. Dito isso, e, admitindo que a música, bem como a arte em geral, tem o papel absoluto e primordial de ser um retrato de tudo o que há na vida. Existem artistas que são comprometidos em explorar, buscar e empregar em sua arte não apenas as coisas boas e gostosas, mas também esse lado sombrio e negligenciado. Artistas como os integrantes da banda The Flaming Lips, por exemplo. No decorrer de sua carreira de décadas, os Lips colecionam clássicos, bem como projetos altamente ambiciosos e desafiadores, difíceis de imaginar postos em prática. Zaireeka, um álbum quadruplo de 1997, idealizado para tocar todos ao mesmo tempo, uma música de 24 horas de duração são apenas alguns dos projetos insanos da banda, que acaba de ganhar mais um capítulo, com o lançamento do álbum The Terror.




Apesar do jeito brincalhão de drogado com cabeça nas nuvens, Wayne Coyne, líder da banda, é um exemplo claro de um artista que leva totalmente a sério a sua arte, sacrificando inclusive sua vida pessoal para se dedicar totalmente às suas criações e suas viagens artísticas. Em recente entrevista à Pitchfork, Wayne cede um dos raros momentos em que fala de sua vida pessoal, afirmando que The Flaming Lips é sua família e que não se imaginaria sendo pai, com todas as responsabilidades e grilhões que acompanha o nascimento de um herdeiro. Ainda assim, ele pouco fala da sua separação da companheira de vinte e cinco anos, Michelle. Apesar de não ser declarado, é difícil não imaginar que essa perda tenha influenciado o conceito e o som de The Terror.

Em relação ao conceito, nesta mesma entrevista, Coyne fala: “eu realmente acredito que quando você é jovem, você deve pensar que o mundo é seu e você pode fazer qualquer porra que quiser com ele, e as pessoas devem sair de seu caminho. Quando você vai envelhecendo, no entanto, você percebe – e esta é uma boa notícia, embora também devastadora – que há amor que irá morrer e amor que você não pode entender mais. Eu não acho que eu iria desaparecer ou me matar se esse amor desaparecesse – eu posso desejar que sim, mas a vida simplesmente continua. Esta é a frieza nesse álbum, e é a natureza da realidade. É bem filha da puta. Quanto mais felicidade nós sentimos, mais nós sabemos que há sofrimento e dor no mundo. Você não pode conhecer um sem ter a realização do outro”. Este é The Terror nas palavras de seu idealizador, Wayne Coyne.




Agora vamos a sua realização, de fato. Coyne levou sua arte ao extremo ao tentar retratar esse sentimento de desespero e terror. Ele não se importou que sua música ficasse quase inaudível, estranha, sombria, catastrófica. Dizer que The Terror é bom é complicado. Ele não deve ser julgado como os outros discos. Simplesmente não há nada como ele. Não dá para analisar as músicas isoladamente, mas sim como um todo, uma unidade totalmente inseparável. É um disco desafiador. Não se gosta dele assim de imediato. Não sei nem mesmo se chega-se a gostar dele! Eis o grande desastre e o grande trunfo de The Terror. Era exatamente essa a sensação que Wayne queria que sentíssemos ao nos apresentar este álbum. Assim fica explicado as apresentações ao vivo com as músicas de The Terror, com um maravilhoso efeito visual e a imagem medonha de Wayne todo iluminado segurando uma boneca bebê no braço, como no Lollapalooza Brasil e até mesmo no famoso programa de Tv David Letterman. É pavoroso. Algumas músicas podem até ser escutadas, como “Look... The Sun Is Rising”, ou “Try To Explain”. No entanto, outras são completamente inaudíveis e acabam se tornando experiências sofríveis, como “You Lust”.

The Terror é, por fim, sinistro. Tanto pelo seu conceito quanto pela sua execução. Numa análise musical, lendo a música como uma forma de entretenimento, é um álbum horrível. No entanto, num sentido mais nobre e amplo, elevando da música seu papel artístico, The Terror é uma obra prima. É a execução máxima de um projeto ambicioso, que chega a sacrificar a si mesmo em virtude da representação exata de um sentimento horrendo. E, diante do recentíssimo atentado terrorista na Maratona de Boston que aconteceu hoje, o desespero, o medo, enfim, o terror é o que está representado nessas faixas. Um álbum que somente The Flaming Lips seria capaz de fazer.


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